O HOMEM DO ANO

Vamos direto ao assunto: terminada a projeção de O Homem do Ano, parece que nada aconteceu na tela. A história do homem comum que vira matador, interpretado por um irregular Murilo Benício, some como poeira no vento imediatamente depois do início dos créditos do filme. A culpa talvez seja da história original de Patrícia Melo, que tenta estabelecer uma brasilidade no romance policial, algo que soa meio estranho e talvez artificial. Mas o texto de Patrícia tem seus méritos, menos pela escrita e mais pelas idéias. A transformação do personagem num ídolo em sua comunidade local é muito boa. Caso fosse um curta-metragem sobre este momento, seria um filme muito bom. Mas O Homem do Ano, assim como o romance que o inspirou, conta uma história grande. E o que atrapalha é o que vem a seguir. A criatividade das cenas iniciais parece desaguar num poço de falta de idéias realmente consistentes.

A culpa poderia ser da adaptação de Rubem Fonseca, que assina o roteiro do filme dirigido pelo filho. Mas Rubem é considerado o maior autor do romance policial, e fonte inspiradora máxima de Patrícia Melo em seus trabalhos. Eu, para ser bem sincero, nunca li um livro de Fonseca e nunca tive vontade. Os trechos que chegaram à minha vista foram suficientes. Suficientes para eu me desinteressar. O romance policial brasileiro parece rascunho dos filmes do gênero produzidos nos Estados Unidos nos anos 40 e que tiveram seu ápice no cinema noir. Tudo parece copiado e forçado. Os enxertos brasileiros nas histórias soam artificiais e programados para as críticas que viriam caso eles não existissem. Há uma coisa pouco brasileira na produção de filmes policiais. Desde que o Brasil retomou sua produção cinematográfica, há pouco menos de dez anos, as tentativas de realizar um filme do gênero realmente bom vinham reprisando frustrações até que Beto Brant surgiu com seus Matadores (97) e O Invasor (02). Rural ou urbano, o cinema de Brant é bom cinema e bom cinema policial.

O Homem do Ano peca pelo excesso. José Henrique Fonseca quer fazer um filme profundo, quer mergulhar na mente de seu protagonista, mas esbarra num roteiro que nunca concentra a ação, joga as cenas na tela e não envolve. Murilo Benício, que já deu exemplos de que é talentoso, começa o filme com um sotaque e um jeito de falar que tentam exacerbar a estranheza de seu personagem. Tentam mostrar o quanto ele tosco. Em seguida, perde essa característica e melhora sua interpretação, mas nunca chega a estar satisfatório. Natália Lage, pelo contrário, quando é uma coadjuvante, está perfeita em cena. Consegue a profundidade que falta ao filme e ao resto do elenco, mas a virada de sua personagem a deixa estereotipada e põe um texto muito ruim na sua boca. A edição do longa, acelerada, é bem executada, mas não funciona como linguagem porque as coisas não duram o tempo que deveriam durar. Quando menos você espera, O Homem do Ano acaba e você nem sente.

O Homem do Ano
O Homem do Ano, Brasil, 2003
Direção: José Henrique Fonseca.
Elenco: Murilo Benício, Natália Lage, Cláudia Abreu, Jorge Dória, André Gonçalves, Moska, Paulo César Pereio, Amir Haddad, Perfeito Fortuna, Lázaro Ramos, André Barros, José Wilker, Agildo Ribeiro, Mariana Ximenes, Carlo Mossy, Preta Gil, Vic Militello, Marilu Bueno, Wagner Moura, José Henrique Fonseca.
Roteiro: Rubem Fonseca, baseado no livro O Matador, de Patrícia Melo. Produção: José Henrique Fonseca, Leonardo Monteiro de Barros e Flávio R. Tambellini. Fotografia: Breno Silveira. Edição: Sérgio Mekler. Direção de Arte: Toni Vanzolini. Figurinos: Cláudia Kopke. Música: Dado Villa-Lobos.

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