Maria Luísa Mendonça

A comparação mais óbvia que pode ser feita ao se tratar deste filme de estréia de Carlos Cortez é com Pixote, a Lei do Mais Fraco, o clássico da delinqüência juvenil brasileira, de 1980. Tão imediata que o próprio Cortez fez questão de acentuá-la já na primeira imagem do filme, referência a uma das cenas mais famosas do longa de Hector Babenco. Tão forte que, não satisfeito, o diretor voltou a reforçá-la na imagem seguinte. Coisa de gênio. Transformar em homenagem a semelhança que poderia ser uma fragilidade do filme e torná-lo alvo fácil.

Revertido esse possível primeiro revés, o filme se escora com toda a força na interpretação de Maxwell Nascimento, um ‘natural’, diriam os norte-americanos, algo como uma pequena força natureza transformada em ator. Pelo menos é o que se pretende já que não há comparação possível com o demoniozinho criado por Douglas Silva em Cidade de Deus, por exemplo. O garoto até tem talento, mas sua fúria, ainda que pareça espontânea, é tão bruta (no sentido de faltar lapidação) que a força dramática da história tem um limite.

Não dá pra dizer que gosto do universo de Plínio Marcos, o que realmente relativiza minha visão sobre o filme, mas Querô, não apenas por se tratar de um texto dos anos 70, parece um filme datado. Mesmo com aquela câmera trêmula, que, convenhamos, virou o maior clichê do cinema que se pretende realista, é realizado de forma tão convencional, tão antiga, soa meio perdido no tempo, preso a uma época. Pode-se até argumentar que o assunto ainda é atual, mas fazer um filme que certamente ganharia tom de denúncia sobre uma questão de hoje como se faria há vinte, trinta anos não limita possibilidades?

Num ano em que as favelas e a vida bandida ganharam tantos filmes atuais, bons ou ruins (Antonia, Cidade dos Homens, Tropa de Elite), onde Querô se encaixa? Num lugar de homenagem saudosista a um escritor maldito? Numa tentativa de modernizar (há isso?) a denúncia das crianças nas ruas? Acho o filme sincero e com alguns achados: o próprio protagonista, o Brandão de Ailton Graça (insuportável), um, apenas um, dos muitos flashbacks borrados (no meio, os outros são toscos), e mais isso ou aquilo. Mas no geral o filme parece ser de outra época, num sentido ruim. E Plínio Marcos tem data de validade. O tempo o venceu.

Querô EstrelinhaEstrelinha
[Querô, Carlos Cortez, 2007]

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